sexta-feira, 4 de dezembro de 2015

O Quilombo dos Palmares


                            O Quilombo dos Palmares,  (por Norton Kornijesuk) :

Ganga Zumba e Gana Zona retratados no filme "Quilombo", de 1984

O Quilombo dos Palmares ficava localizado num grande território montanhoso situado no oeste do atual Estado de Alagoas, durante o século XVII, e se estendia desde a margem do Rio São Francisco até o Cabo de Santo Agostinho, no litoral de Pernambuco, formando uma região livre que se autodenominou de “A República dos Palmares”. Sua extensão territorial tinha quase o tamanho de Portugal, e esta grande nação negra chegou a contar com cerca de 50.000 pessoas, entre negros foragidos, ex-escravos índios e alguns brancos. Foi combatido pelos holandeses, portugueses e bandeirantes paulistas, mas resistiu bravamente por mais de 100 anos. Seu principal mocambo, chamado de Mocambo dos Macacos, ficava na Serra da Barriga, e hoje, para relembrar aquele grande foco de resistência escrava do Brasil, foi construído o Parque Memorial Quilombo dos Palmares, na cidade de União dos Palmares, e que é administrado pelo Instituto do Patrimônio Histórico e Artístico Nacional (Iphan). Dezesseis famílias, descendentes dos negros quilombolas, ainda vivem dentro da área do parque. Na foto abaixo vemos o Ministro da Cultura, Gilberto Gil, quando inalgurava o Parque Memorial.
Durante o século XVII, o Brasil Colonial ainda se encontrava no final do Sistema das Capitanias Hereditárias e já não se respeitava mais o Tratado de Tordesilhas, que foi aquele que dividiu a América numa parte espanhola e outra parte portuguesa. A economia do antigo Brasil Colonial, antes da descoberta do ouro nas Minas Gerais, girava em torno das plantações de cana de açúcar, ao longo do litoral, e da criação de gado, nas áreas do interior. O açúcar era o principal produto, produzido principalmente pelas fazendas e engenhos no interior das Capitanias de Pernambuco e São Vicente, e o Nordeste era a região mais desenvolvida desta grande colônia portuguesa.

Por falta de informação, pesquisa e melhores estudos históricos, os brasileiros pouco conhecem sobre a verdadeira história do seu país, sabem apenas superficialmente um pouco daquilo que aconteceu no rico passado histórico desta grande nação. Para entendermos um pouco mais sobre este interessante assunto, vamos precisar fazer uma retrospectiva histórica da situação política e econômica do Brasil no final do século XVI.

O Brasil foi oficialmente descoberto pelo almirante português Pedro Alvares Cabral em 22 de abril de 1500. Inicialmente, os primeiros produtos que aqui foram explorados foram uma madeira de seiva vermelha, chamada Pau Brasil, e as chamadas drogas e animais do sertão, como as ervas, peles de animais, aves raras e, eventualmente, a captura de alguns escravos índios. Para isto foram implantadas algumas feitorias ao longo da região litorânea do Brasil.

A Coroa Portuguesa não teve muito interesse pelo Brasil até o ano de 1530, quando instituiu o Sistema de Capitanias Hereditárias e mandou ao Brasil uma grande expedição, para colonizar a terra e implantar o cultivo da cana de açúcar, sob o comando de Martim Afonso de Souza.
Martim Afonso fundou a Vila de São Vicente, em 1532, no litoral do atual Estado de São Paulo, e iniciou o cultivo da cana de açúcar, com a construção do Engenho do Governador. Mas, teve que voltar para Portugal porque o rei, Dom João III, estava planejando dividir o Brasil em 12 Capitanias Hereditárias, para serem entregues aos cuidados de importantes nobres da corte, que assim se transformariam em donatários. 

O donatário tinha a obrigação de organizar as atividades que fossem lucrativas e de administrar o seu território, que também poderia ser repassado para os seus herdeiros. Portugal ficou apenas com o trabalho de fiscalização e arrecadação dos impostos, além de ter a posse das terras, que não podiam ser vendidas. O Sistema das Capitanias Hereditárias funcionou até 1759, quando foi extinto pelo Marquês de Pombal, (Sebastião José de Carvalho e Melo). As duas únicas capitanias que prosperaram foram São Vicente e Pernambuco, graças aos lucros obtidos com o cultivo da cana e a produção do açúcar, que era exportado para a Europa. 

A Capitania de Pernambuco foi entregue ao nobre Duarte Coelho Pereira, que chegou ao Brasil em março de 1535 acompanhado da sua mulher, Brites de Albuquerque, dos filhos e pelo seu cunhado Jerônimo de Albuquerque, também chamado pelos historiadores de “Adão Pernambucano”, (porque teve 24 filhos!).

A capitania era habitada pelos índios Tabajaras e Caetés, sendo que já existia uma feitoria nesta região, onde foi fundada a Vila de Igaraçu, em setembro de 1535. Dona Brites de Albuquerque, que tinha apenas 17 anos, sabia ler e escrever, o que era raro para as mulheres da sua época.
Jerônimo de Albuquerque logo começou a se meter em encrencas com os índios tabajaras, e chegou a perder uma das vistas nas escaramuças, mas, a situação melhorou quando Duarte Coelho realizou o seu casamento com a filha do cacique Arcoverde, conhecida como Tabira.

Duarte Coelho chegou ao Brasil com sessenta anos, e trouxe colonos do norte de Portugal, (muitos eram judeus, ou cristão novos), e alguns mestres açucareiros da Ilha da Madeira, especialistas na plantação da cana de açúcar e na produção do açúcar.

A sorte foi favorável para Duarte Coelho que, depois da plantação de cana de açúcar, tabaco e algodão, também construiu o primeiro engenho de açúcar em Pernambuco, chamado Engenho Nossa Senhora da Ajuda, (apelidado de Forno da Cal). Duarte Coelho também fundou a Vila de Olinda, em 1537, que logo se transformou na sede da Capitania da Nova Lusitânia, conforme ele mesmo lhe chamava. 
A Capitania da Nova Lusitânia prosperou e logo era responsável pela exportação de mais da metade do açúcar produzido na colônia brasileira. Seu cunhado Jerônimo de Albuquerque também fundou um engenho, o de Beberibe, e pediu autorização ao Rei de Portugal para importar os primeiros escravos negros da Guiné, na África.

A partir da segunda metade do século XVI, grupos de colonos portugueses começaram a organizar as famosas “Entradas”, que eram as expedições que entravam pelo interior do Brasil para procurar riquezas, metais preciosos e capturar os índios para escravizar.  

Os índios brasileiros, que tinham um tipo de vida seminômade, e se deram bem no trabalho de extração do Pau Brasil, não se adaptaram aos rigores e à disciplina do trabalho sedentário agrícola. Por isso, o rei autorizou a vinda dos escravos negros da África, e recomendou que os índios também fossem batizados e usados para fazer casamentos com os portugueses, para tentar fazer o povoamento da colônia. Mesmo assim, a escravidão dos índios no Brasil durou até 1758, quando foi abolida definitivamente pelo Marques de Pombal.

Os comerciantes de escravos vendiam os negros como se fossem mercadorias, adquirindo-os das tribos africanas que os haviam feito prisioneiros. A maioria dos negros da Bahia é descendente dos escravos que vieram da cidade de São Jorge da Mina, na Guiné, onde eram usados em trabalhos de mineração. O tráfico de escravos dava lucro para a Coroa Portuguesa porque ela também cobrava impostos dos traficantes.

Outra região que fornecia muitos escravos para o Brasil era o Reino do Congo, que começou a vender escravos durante o Reinado de Dom Afonso I, em 1510, e prosseguiu por mais de 300 anos! Os próprios africanos escravizavam-se uns aos outros, de acordo com a supremacia de algumas tribos sobre as outras. Quem quiser saber mais sobre a África e as suas civilizações pode clicar no link abaixo e conhecer vários artigos interessantes sobre aquele continente:




Os negros foram usados mais nas lavouras e nos serviços domésticos, enquanto que algumas profissões liberais, tais como carpinteiro, ferreiro, pedreiro, pintor, alfaiate, ourives, artesão, tecelão, farmacêutico e outras, eram mais desenvolvidas pelos chamados “cristãos novos”. Nesta época, os cristãos novos eram os judeus e os muçulmanos convertidos ao cristianismo.

O donatário e Governador da Capitania de Pernambuco, Duarte Coelho Pereira, administrou muito bem a Nova Lusitânia por 19 anos e, quando já estava doente e com 79 anos, teve que voltar para Portugal, onde veio a falecer, em 1554.

A mulher de Duarte Coelho, Dona Brites de Albuquerque, que já tinha 37 anos naquela época, ficou no Brasil em seu lugar, junto com o seu irmão Jerônimo de Albuquerque e, durante 30 anos, ela se transformou numa ótima administradora da Capitania de Pernambuco, até a data da sua morte, em 1584.

Antes da morte de Dona Brites, a Capitania de Pernambuco contava com cerca de 66 engenhos, em 1583, que produziam 200 mil arrobas de açúcar por ano. Sua população era de mil colonos e cerca de mil escravos negros. O povoado do Recife era apenas uma pequena vila, do outro lado do Rio Capibaribe, com alguns armazéns e uma pequena igreja. Olinda, entretanto, era uma bela e próspera cidade com 72 ruas! Olinda recebia navios da Europa com vários artigos de luxo e podia ser comparada com algumas das maiores cidades de Portugal.

As plantações de cana se adaptaram bem ao solo do tipo “massapê” daquela região do Nordeste. Para fabricar o açúcar, os engenhos precisavam primeiro extrair o caldo de cana nas moendas. Depois, o caldo era levado para as caldeiras, onde era cozido para se obter o xarope de cana. O xarope era transferido para um grande tanque, onde era agitado para acelerar a cristalização do açúcar. Depois, o xarope agitado era colocado em formas, com o formato cônico, que tinham um furo em baixo para escorrer o melaço da cana. O que sobrava nas formas era o açúcar do tipo mascavo, com o formato de um pão-de-açúcar.

Em Pernambuco o açúcar mascavo era submetido a um clareamento, que somente os mestres que vieram da Ilha da Madeira conheciam: era empregada água de cal e carvão para efetuar o clareamento. Com isto era obtido o açúcar do tipo “demerara”, muito mais apreciado pelos consumidores europeus. Este açúcar era exportado para a Europa em caixas de madeira.

Para efetuar todo este processo de fabricação nos engenhos da colônia era necessário um grande número de escravos, que vieram da África. A cachaça, (ou aguardente), era um subproduto da indústria açucareira que foi usada como meio de troca no comércio de escravos.

Para melhor controlar as capitanias hereditárias, e regular a cobrança dos impostos, o rei de Portugal, Dom João III, resolveu instituir, no final de 1548, o Governo Geral do Estado do Brasil, com sede em Salvador, na Bahia de Todos os Santos. Salvador foi a primeira capital do Brasil Colonial.
O primeiro Governador Geral foi Tomé de Souza, que chegou na Bahia no dia 29 de março de 1549, acompanhado por uma expedição com cerca de mil homens. Mais tarde, em 1621, também foi criado o Estado do Maranhão, com capital em São Luís.

Em 1580, por causa de casamentos e conspirações palacianas, houve a união do Reino de Portugal com o Reino da Espanha, formando a chamada “União Ibérica”, que durou até 1640. Assim, Portugal passou para o domínio da Espanha, sendo que não havia mais a necessidade de se respeitar o Tratado de Tordesilhas.

Durante a União Ibérica, a vigilância e o controle das capitanias hereditárias, no Estado do Brasil, ficou mais relaxado. Os escravos africanos também perceberam isto e, assim, começaram a acontecer as primeiras fugas de escravos para as matas e as regiões mais afastadas do litoral brasileiro, a partir de 1588, onde eles se reuniam em aglomerados populacionais chamados de mocambos. 
Um grupo de mocambos formava um quilombo, que ocupava uma região bem maior. Foi nesta época que começou a aparecer a figura do Capitão do Mato, que era um encarregado de caçar os escravos fugitivos.

Em 1606 um grupo de escravos jagas, que vieram de Angola, conseguiu fugir de algumas fazendas da Capitania de Pernambuco e procurou se estabelecer na região oeste do atual Estado de Alagoas, onde existia uma grande região montanhosa e selvagem. Neste local, na Serra da Barriga, eles deram início a um mocambo que ficou famoso entre os escravos. Ele foi chamado de “Angola Janga”, ou Pequena Angola. Mais tarde, o mocambo de Angola Janga deu origem ao famoso Quilombo dos Palmares.

Nos mocambos os escravos fugitivos voltavam a ter uma vida livre, na qual podiam cultivar e preservar as suas culturas e tradições. Era uma sociedade a parte, dentro do território brasileiro. Os negros construíam suas casas com a palha dos coqueiros e, em volta dos mocambos, faziam uma cerca de madeira para se protegerem dos ataques. Cada mocambo organizava-se de acordo com as suas próprias regras, mas a propriedade do solo era coletiva, sendo que o trabalho era organizado de modo comunitário. A maioria dos quilombolas tinha igual acesso a todos os bens de sobrevivência.

Os quilombolas produziam muitos tipos de produtos e alimentos, que eram vendidos para a região da monocultura canavieira, onde ficavam os engenhos, que por sua vez, quase não produziam muitos alimentos e outros produtos. Assim, as fazendas daquela região dependiam dos produtos do quilombo. Quem quiser ver uma retrospectiva sobre os primeiros mocambos desta região pode acessar abaixo o link do interessante vídeo explicativo:




Já nos primeiros anos da sua formação o mocambo de Angola Janga começou a dar problemas porque os negros invadiam as fazendas da região para libertar escravos, roubar armas e comida, e também para raptar as mulheres, pois elas faziam falta no mocambo. Alguns negros chegaram a se casar com as índias daquela região. O Governador Geral do Estado do Brasil, Diogo Botelho, mandou uma expedição contra eles, mas eles só encontraram cabanas abandonadas, porque os palmarianos tinham fugido antecipadamente.

Em 1621 Portugal resolveu dividir o Estado do Brasil, e foi criado o Estado do Maranhão, com a capital na cidade de São Luis. O Estado do Brasil continuou com a sua capital em Salvador.
A prosperidade da produção açucareira no Estado do Brasil começou a despertar a cobiça de outras nações, principalmente da Holanda, que tinha planos para invadir a região Nordeste do Brasil, com a intenção de se apoderar desta grande região produtora de açúcar.

Por volta de 1621 também foi criada a Companhia Holandesa das Índias Ocidentais, por um grupo de mercadores holandeses, que ficaram encarregados de controlar o comércio marítimo entre as Ilhas do Caribe, bem como o tráfico de escravos no Oceano Atlântico, no Brasil, no Caribe e na América do Norte. Eles queriam controlar o comércio na América.

A Companhia das Índias Ocidentais era uma empresa de capital misto, (público e privado), e foi ela quem financiou a invasão das áreas produtoras de açúcar do Brasil.

Em 1630 os holandeses invadem e assumem o controle do litoral de Pernambuco e das áreas produtoras de açúcar do Nordeste, que agora passou a se chamar “Nova Holanda”. A Espanha, que era inimiga da Holanda, e agora governava as terras do Brasil, por causa da União Ibérica, não esboçou nenhuma reação de imediato. 
Os holandeses aproveitaram para colocar fogo na cidade de Olinda, e começaram a construção de uma nova capital, no povoado do Recife. Também conseguiram uma aliança com os índios tapuias, que se tornaram seus colaboradores. Muitos índios tapuias foram usados para atacar a resistência dos portugueses.

O quarto e último donatário da Capitania de Pernambuco foi Duarte de Albuquerque Coelho, que era ajudado nesta tarefa por seu irmão, Matias de Albuquerque. Os irmãos Albuquerque tentaram lutar, mas devido à grande superioridade do inimigo, resolveram fazer uma retirada estratégica para a Bahia. No caminho, em Porto Calvo, Matias de Albuquerque julgou e enforcou o fazendeiro Domingos Fernandes Calabar, por traição, pois ele tinha se aliado aos holandeses.

Mais tarde, Duarte de Albuquerque escreveu um livro, onde conta como foi a sua luta contra os holandeses, no período de 1630 até 1636, chamado “Memórias diárias de la guerra del Brasil”. Este livro foi publicado em Madri, no ano de 1654.

Em 1636 foi nomeado o conde João Maurício de Nassau para governar a região da Nova Holanda! Nassau introduziu novos métodos de cultivo da cana-de-açúcar, permitiu a liberdade religiosa, organizou os serviços públicos, concedeu empréstimos aos senhores de engenho e construiu várias obras na cidade do Recife, que foi chamada de “Cidade Maurícia”. Também trouxe um grupo de cientistas e artistas que logo começou a estudar aquela bonita região.

Em 1640 os portugueses romperam o acordo de 60 anos que tinham com a Espanha, pela União Ibérica, e proclamaram o Duque de Bragança como o novo rei de Portugal. Ele recebeu o título de Dom João IV e o apelido de “O Restaurador”. Começou assim a Dinastia de Bragança em Portugal, que durou até 1910!

Dom João IV comandou a Guerra da Restauração, contra a Espanha, que durou até 1668. Também fez uma aliança com a Holanda, para combater a Espanha e, por isso, a invasão do Nordeste pela Holanda não fazia mais sentido, uma vez que agora eles eram aliados!

Maurício de Nassau permaneceu como Governador da Nova Holanda por oito anos e, em 1644, voltou para a Europa. Mas a Companhia das Índias Ocidentais, que ele representava, continuou no domínio da região açucareira do Nordeste.

A fama do Quilombo dos Palmares já era muito conhecida por todos os moradores da Capitania de Pernambuco, e também chegou a despertar a cobiça dos holandeses, que enviaram contra ele duas expedições, com a intenção de capturar os escravos fugitivos.
Em 1644 os holandeses organizaram a primeira investida contra Palmares, a mando de Rodolfo Baro, um holandês que tinha uma fazenda no Rio Grande do Norte, no meio das terras dos índios tapuias, dos quais era um aliado.

Rodolfo Baro sabia falar a língua tupi, pois foi criado no meio dos índios do litoral do Rio de Janeiro, região onde naufragou quando tinha apenas sete anos. Os índios tapuias também eram aliados dos holandeses, e Rodolfo Baro organizou a sua expedição com os índios tapuias. Mas eles não tiveram sucesso nos ataques aos mocambos dos negros do Quilombo dos Palmares.

A segunda expedição dos holandeses contra o quilombo foi comandada por João Blaer, em 1645. João Blaer partiu de Salgados em direção ao quilombo, mas, depois de uma semana ficou doente e precisou retornar, deixando o tenente Jurgens Reijmbach no comando da expedição. Jurgens chegou ao Mocambo dos Macacos em 21 de março de 1645, e encontrou o local deserto, porque os negros já tinham sido avisados da vinda dos holandeses.

Os holandeses encontraram um cercado com 220 casas e uma igreja no meio, quatro forjas de ferro, plantações, e uma grande casa para o Conselho Quilombola. Calcularam que lá deveria viver cerca de 1.500 pessoas. Eles tocaram fogo em 60 casas, prenderam apenas quatro negros, e depois voltaram. Meses depois o Comandante João Blaer foi aprisionado e morto pela resistência dos fazendeiros da colônia.

Sabe-se que ainda existem muitos documentos guardados na Holanda, e em Portugal, sobre este período da nossa história, e que precisam ser traduzidos e estudados.
Os senhores de engenho da Nova Holanda estavam endividados e deviam para a Companhia das Índias Ocidentais cerca de 5,7 milhões de florins! Eles começaram então a organizar a expulsão dos holandeses, para se livrar das dívidas! Por força da aliança de Portugal com os holandeses, o rei Dom João IV não podia apoiar abertamente os insurgentes, mas chegou a enviar alguns homens e suprimentos para Salvador.

Uma expedição militar, organizada no Rio de Janeiro em 1648, pelo Governador daquela capitania, Salvador Correia de Sá e Benevides, um grande militar português, foi enviada para Angola com o objetivo de tomar dos holandeses a capital e o porto de Luanda. A expedição teve sucesso e a cidade foi tomada, o que deixou os portugueses com o controle do tráfico de escravos naquela região da África.
A Insurreição Pernambucana foi um movimento organizado pelos proprietários dos engenhos para a expulsão dos holandeses do Nordeste. As vitórias dos revoltosos nas batalhas travadas nos Montes dos Guararapes, em 1648 e 1649, fez com que Portugal finalmente enviasse uma esquadra armada para invadir o Recife, em dezembro de 1653. Em janeiro de 1654 os holandeses se renderam, e assinaram o Tratado de Taborda, onde lhes ficou assegurado uma indenização, pelos 24 anos de domínio da Companhia das Índias Ocidentais no Nordeste.

Os holandeses se retiraram, mas levaram para a região das Antilhas as técnicas de produção do açúcar, que desenvolveram durante os 24 anos em que permaneceram no Brasil. Nas ilhas do Mar do Caribe os holandeses deram início à produção açucareira. A partir de 1655 houve uma queda nas vendas do açúcar produzido no Nordeste, por conta da perda do monopólio na comercialização, por parte de Portugal. Muitas fazendas e engenhos começam então a ser abandonados, o que facilitou a fuga de muitos escravos em direção ao Quilombo dos Palmares.
Em 1682 foi criada a Companhia de Comércio do Maranhão, para tratar do comércio dos escravos africanos que, a partir daí, começaram a chegar em grande número ao Brasil. Os desmandos desta companhia acabaram por desencadear a Revolta dos Irmãos Beckman, no Maranhão, em 1684.

No meio do século XVII os senhores de engenho das lavouras produtoras de cana-de-açúcar do Recôncavo Baiano, e também das terras férteis em torno das cidades de Olinda e Recife, precisaram importar cada vez mais escravos africanos para o Brasil.

No final do século XVII cerca de 40% de toda a população escrava do mundo estava localizada aqui no Brasil! A grande maioria da nossa população era constituída por escravos! As autoridades portuguesas, instaladas aqui no Brasil, sentiram a necessidade de aumentar o controle sobre estes escravos, até para evitar as fugas, que estavam acontecendo em grande número!

Nesta altura da nossa história entra em cena outra grande personagem histórica! Ela foi a mais importante mulher do Quilombo dos Palmares, mas é bem pouco conhecida por aqueles que estudam a sua história. Estou falando de uma princesa forjada no clamor das batalhas e de sangue nobre. Seu nome era Aqualtune Ezgondidu Mahamud da Silva Santos, e foi ela quem criou o famoso “Reino dos Palmares”, sendo a sua primeira rainha!

Aqualtune nasceu na África e, segundo ela mesma dizia, era filha do rei do Congo, o Mani Congo, conhecido como Rei Dom Antonio Manimulaza I. Segundo a história, ela já era mãe de pelo menos três filhos adultos, que nasceram no Reino do Congo. O mais velho chamava-se Ganga Zumba, ou Gana Zumba, e nasceu provavelmente por volta de 1633. Mais tarde Ganga Zumba se transformaria no segundo rei do Reino dos Palmares, em Pernambuco, no Brasil. O segundo filho de Aqualtune foi Gana Zona, e sua filha mais velha se chamava Sabina. Não sabemos os nomes dos seus outros filhos, que provavelmente nasceram no Brasil.
Aqualtune era uma brava guerreira e liderou um exército de 10.000 homens na Batalha de Mbwila, em 1665, contra a tribo dos jagas e as forças enviadas por Portugal. As forças do Reino do Congo foram derrotadas e Aqualtune foi capturada. Seu pai, o Mani Congo, teve a cabeça cortada e exibida numa igreja.

O que muitos historiadores não sabem é que o rei do Congo, Dom Antonio, foi derrotado por forças armadas vindas do Brasil, a mando do Rei de Portugal, e controladas pelo paraibano André Vidal de Negreiros, então Governador de Luanda.

Na verdade, o comando das forças portuguesas era dirigido pelo cabo angolano Luís Lopes Sequeira, e era composto por cerca de 360 mosqueteiros brancos e mais de 6.000 negros jagas. A chacina foi grande porque, segundo relatos daquela época, as tropas portuguesas mataram mais de 100.000 congoleses nesta célebre batalha de Ambuíla, (Mbwila), o que sem dúvida é uma quantidade impressionante de mortos!

André Vidal de Negreiros já era um experiente e veterano combatente das Batalhas dos Montes Guararapes, que causaram a expulsão dos holandeses do Estado do Brasil. Na verdade, os portugueses estavam querendo se apoderar das minas de cobre do Reino do Congo.

Quem quiser saber mais sobre esta batalha, e a história do Congo, pode procurar no site abaixo:




Aqualtune, os seus filhos, alguns membros da realeza do Congo e mais alguns outros guerreiros congoleses aprisionados, foram todos vendidos como escravos e encaminhados para o porto de embarque, de onde seguiram viagem para o nordeste do Brasil. 

Durante esta viagem, ao cruzar o Oceano Atlântico, Aqualtune, que já devia estar com uns 47 anos de idade, foi abusada sexualmente várias vezes por marinheiros e até por outros escravos. Chegando ao Porto do Recife, em Pernambuco, Aqualtune e os seus filhos foram comprados pelo Engenho de Porto Calvo, em Alagoas.

Aqualtune, que tinha uma boa aparência, foi comprada para ser escrava reprodutora e, quando chegou a Porto Calvo, foi obrigada a se casar com um escravo do engenho, para fins de reprodução. Os escravos da senzala ficaram impressionados quando souberam da origem real dela e dos seus filhos. Ganga Zumba, naquela época, estava com 32 anos. Calculo que Gana Zona deveria ter cerca de 29 anos e Sabina uns 27 anos.
Entretanto, temos que fazer agora uma observação importante: muitos historiadores dizem que Zumbi, o quarto rei de Palmares, era filho de Sabina e que ele nasceu na Serra da Barriga em 1655. Mas, como ele poderia ser filho de Sabina e ter nascido em 1655 se Sabina chegou a Porto Calvo em 1666? A não ser que ele fosse filho de uma outra filha de Aqualtune, que já tinha sido capturada antes da Batalha de Ambuíla, e trazida como escrava para o Brasil. Ou então, a própria Sabina poderia ter sido capturada, anos antes desta batalha, e ter sido enviada para o Brasil, encontrando depois a sua mãe aqui, nas terras da Capitania de Pernambuco! 
Outra hipótese que devemos analisar é o fato de Aqualtune estar mentindo, e esta história toda de princesa ser apenas uma invenção dela para tirar algum tipo de proveito! Tudo é possível, uma vez que não existem documentos escritos que comprovem esta sua versão. Mas, vamos supor que tudo era verdade, e que Aqualtune era mesmo filha do rei Dom Manuel. Pelo menos os escravos da senzala do Engenho de Porto Calvo acreditaram nela, pois ela falava o idioma Kimbundu e demonstrava que tinha mesmo algum tipo de realeza!

Uma princesa do Congo, uma das últimas herdeiras viva do Reino do Congo, e acostumada a mandar e a liderar, não ia mesmo se acomodar no papel de uma escrava de engenho. Aqualtune e os seus aliados planejaram bem a sua fuga e, quando eles estavam numa plantação de cana, mesmo ela estando grávida, conseguiu escapar, na companhia dos seus filhos e de mais alguns escravos da sua etnia, embrenhando-se na mata existente naquela região.

Ela já tinha ouvido falar no Quilombo dos Palmares, (ou Angola Janga), e foi para lá que se dirigiu. Durante a sua fuga do engenho, no ano de 1666, Aqualtune liderou um grupo de cerca de 200 escravos negros, que foram se juntando a ela, em busca da liberdade. Muito provavelmente alguns destes escravos já tinham lutado na guerra do Reino do Congo!

É quase certo que o nascimento de mais uma filha de Aqualtune ocorreu durante esta sua fuga do engenho. Quando chegou ao Mocambo dos Macacos, a capital dos Palmares, a origem real de Aqualtune foi logo reconhecida pelos palmarianos, que a receberam bem e lhe concederam o direito de ter o seu próprio mocambo. A partir daí, Aqualtune começou a influir cada vez mais na vida daquela grande comunidade negra, e acabou fundando o Reino dos Palmares, sendo eleita depois a sua primeira rainha.
No Reino dos Palmares o governo de cada território quilombola era dado para aqueles que já tinham sido chefes em outras ocasiões. Assim, Aqualtune perdeu o seu reino no Congo, mas conseguiu conquistar um outro reino aqui no Brasil!

Muitos historiadores dizem que a filha de Aqualtune, Sabina, foi a mãe do famoso guerreiro Zumbi, e que ele era neto de Aqualtune. O que sabemos de verdade é que Sabina foi mãe de Andalaquituche, e que ele brincava muito com Zumbi quando era pequeno. Andalaquituche foi chefe de um mocambo famoso daquela região.

A língua falada pela nobreza do Reino dos Palmares era o Kimbundu, originária do norte de Angola. Atualmente o Kimbundu é uma das línguas de origem banta mais faladas em Angola. Quem quiser saber mais sobre este interessante idioma poderá clicar no site abaixo:




Com seus conhecimentos políticos e a sua estratégia de guerra, Aqualtune foi fundamental para a consolidação do estado negro do Reino dos Palmares, (que também foi chamado de República dos Palmares). Ela implantou a estratégia defensiva de cavar grandes buracos em volta dos mocambos, para colocar espetos de madeira no fundo. Sobre estes buracos eram colocadas folhas de palmeira para disfarçá-los. Estes buracos eram muito usados na África para se caçar elefantes!

Os negros do quilombo plantavam cana, fumo, banana, mandioca, milho, arroz, feijão, batata doce, algodão, pimenta, frutas, verduras e outros cultivares. Também criavam gado, galinhas, e produziam óleo de coco, aguardente e artigos de palha tais como cestos, chapéus, vassouras, esteiras, etc. Enquanto isso, fora do quilombo, predominava a monocultura canavieira para a produção e exportação do açúcar e seus derivados.

A produção excedente do quilombo era negociada nas vilas de Sirinhaém, Porto Calvo, Penedo e Alagoas, em troca de alimentos, sal, armamentos, ferramentas, pólvora e outros bens. Havia um intenso intercâmbio comercial dos palmarianos com os brancos e até com as tribos indígenas. 

O Reino dos Palmares expandiu-se  muito enquanto os brasileiros, portugueses, espanhóis e holandeses lutavam entre si. Segundo pesquisas históricas, em 1670, o Quilombo dos Palmares contava com cerca de 50.000 habitantes e existiam no mínimo 11 mocambos dentro daquele reino negro.

O Mocambo dos Macacos, que era uma espécie de capital do reino, tinha cerca de 1.500 casas e uma população estimada de 8.000 habitantes. Era protegido por uma cerca de madeira dupla e por torres de observação. O Mocambo do Amaro tinha cerca de 5.000 habitantes, e o Mocambo de Subupira era onde ficava o centro do poder militar e o Conselho dos Chefes dos Mocambos. Os outros principais mocambos eram conhecidos pelos nomes de Osenga, Aquatirene, Andalaquituche, Dambrapanga, Sabalangá, Tabocas e Subipiraé.

A extensão geográfica do Reino dos Palmares era grande, pois ia desde as margens do Rio São Francisco até perto do Cabo de Santo Agostinho, no litoral da Capitania de Pernambuco, o que abrangia um território quase do tamanho de Portugal! 

O Quilombo dos Palmares era formado na maioria por negros fugidos, mas também existiam alguns brancos pobres e fugitivos da justiça, cristãos-novos perseguidos e alguns índios. O quilombo resistiu por mais de 100 anos aos ataques, e somente foi totalmente dissolvido no século XVIII, por volta de 1716. Neste período sofreu mais de 40 ataques de expedições criadas para destruí-lo!

Em 1677 a aldeia de Aqualtune, que já estava idosa, foi queimada durante uma expedição que a destruiu. Não sabemos se a antiga rainha, que tinha mais ou menos 61 anos nesta ocasião, foi morta ou conseguiu escapar.

Ganga Zumba, cujo nome correto era Gana Zumba (Grande Lorde), nasceu no Congo em 1633, e tinha 38 anos quando se transformou no segundo rei do Reino dos Palmares. Ele reinou por oito anos, de 1670 até 1678, quando morreu envenenado.

No Reino dos Palmares predominava a POLIANDRIA, ou seja, uma mulher podia ter vários parceiros e filhos desses homens. Isto servia para evitar as brigas entre os homens pela falta de uma companheira. Entre aqueles que ocupavam posições hierárquicas mais relevantes predominava a POLIGAMIA, ou seja, um homem podia ter várias mulheres e filhos dessas mulheres. Ganga Zumba, por exemplo, tinha três mulheres e mais algumas amantes.

Em 1671 teve início a luta oficial do Governo da Capitania, e dos senhores de engenhos do sul de Pernambuco, contra o Reino dos Palmares! Desta vez parece que eles estavam realmente com medo do quilombo se transformar numa força incontrolável! O Reino dos Palmares era numa grande ameaça para os engenhos e a cidade do Recife! Começou então o período que alguns historiadores chamam de “A Guerra dos Palmares”, e que durou aproximadamente 24 anos.

Fernão de Sousa Coutinho, na época em que foi Governador de Pernambuco, organizou três expedições, partindo de lugares diferentes, (uma saiu do Rio São Francisco e duas do litoral), para se reunirem no centro do Quilombo dos Palmares e lá fundar um arraial fortificado, que seria usado para atacar os mocambos dos negros quilombolas. O plano era bom, e as forças armadas conseguem capturar cerca de 200 quilombolas e matar mais alguns.

Em 1674 o governador da capitania envia o famoso Terço dos Henriques para combater Palmares, ou “Terço da Gente Preta”, que era um batalhão de negros que já havia combatido na guerra contra os holandeses, e que era comandado por Henriques Dias, que também era negro e arregimentado pelos brancos. Mas este batalhão também não teve sucesso nesta luta.

Em 1675 o Governo de Pernambuco conseguiu finalmente estabelecer uma base dentro da área do Quilombo dos Palmares. O Sargento-Mor Manuel Lopes atacou um mocambo com cerca de 2.000 moradias e conseguiu permanecer por lá, onde construiu um pequeno arraial fortificado. Nestes combates foi ferido o jovem Zumbi dos Palmares, neto de Aqualtune. Zumbi levou um tiro na perna que o deixou manco para o resto da vida.

Sabe-se que em 1676 o coronel Antônio Jácome Bezerra foi enviado para atacar Palmares, onde destruiu vários mocambos e plantações. Mas, um vigoroso contra ataque das forças palmarianas conseguiu cercar uma grande parte da sua tropa, que foi toda massacrada, obrigando assim o Coronel Bezerra a voltar para o Recife.

Prosseguindo na guerra, o rei Ganga Zumba mandou atacar a cidade de Porto Calvo e, no caminho, incendiou alguns canaviais, inclusive o engenho do rico fazendeiro Cristóvão Lins, que também era o alcaide-mor de Porto Calvo.

A família Lins, de Porto Calvo, tornou-se grande inimiga dos palmarianos, financiando algumas das excursões para acabar com o Quilombo dos Palmares, juntamente com outros fazendeiros daquela região. As vilas de Penedo, Porto Calvo e Alagoas resolveram oferecer vários recursos logísticos para atacar o quilombo, inclusive ajuda financeira para as tropas.

Desta maneira, podemos dizer que Palmares tinha se transformado na maior ameaça para Recife e para o sistema de produção açucareira do Estado do Brasil!
O sargento-mor Manuel Lopes, que já estava acampado dentro da área do quilombo, solicitou reforços ao governador de Pernambuco, que lhe atendeu, enviando para aquele local o sertanista Fernão Carrilho, que também atacou o quilombo, mas não obteve sucesso nesta primeira investida.

O maior inimigo do rei Ganga Zumba, sem dúvida alguma, foi o astuto sertanista Fernão Carrilho. Ele realizou três excursões contra o Reino dos Palmares. A segunda excursão começou em 1677, quando ele se preparou muito bem para atacar o quilombo. Ele recebeu ajuda financeira e logística dos senhores de engenho do sul de Pernambuco. Nesta segunda investida Carrilho mudou a sua estratégia, e resolveu atacar os mocambos dos líderes do Quilombo dos Palmares, com o objetivo de matar alguns nobres e forçar o rei Ganga Zumba a fazer um acordo.

O primeiro mocambo que Carrilho atacou foi a Cerca Real de Aquatirene, onde vivia a antiga rainha Aqualtune. O mocambo foi queimado e parece que Aqualtune desapareceu nesta investida, ou provavelmente fugiu. 

Em seguida, Carrilho atacou o Mocambo do Amaro, onde feriu Gana Zona e matou seus dois filhos, Zambi e Acaiene. Também matou Toculo, um filho ilegítimo de Ganga Zumba. Carrilho também fez cerca de 200 prisioneiros, incluindo uma das esposas de Ganga Zumba e alguns dos seus parentes. O próprio rei Ganga Zumba também foi ferido por uma flechada, mas se recuperou.

Depois da chacina, parece que Fernão Carrilho acreditou que tivesse acabado com o quilombo. Resolveu então fundar o Arraial do Bom Jesus, bem no centro daquela região, onde também construiu um curral para criar gado. No Arraial do Bom Jesus ele estacionou as suas tropas fortemente armadas e ofereceu a Ganga Zumba a chance de fazer um acordo de paz, com a aprovação do Governador Pedro de Almeida. Na verdade este acordo era apenas uma armadilha, com a intenção de retirar os negros da região montanhosa em que se protegiam, conforme veremos adiante.
No começo de 1678 o Governador da Capitania de Pernambuco, Pedro de Almeida, ofereceu ao rei Ganga Zumba um acordo de paz, onde todos os negros nascidos dentro do Quilombo dos Palmares seriam considerados livres e Ganga Zumba poderia escolher uma região, no Vale do Cucaú, e levar o seu povo para lá viver livremente. Ganga Zumba continuaria sendo o chefe, com o título de Mestre de Campo. Em troca, os palmarianos teriam que abandonar a região montanhosa do quilombo, e se comprometer a entregar para as autoridades os escravos que fugissem e fossem para Palmares. Também teriam que se sujeitar às leis das autoridades portuguesas.

O Vale do Cucaú é uma bonita planície situada onde hoje fica o Município de Rio Formoso. Através dele passa o Rio Sirinhaém. Esta seria então a “terra prometida” para os escravos, uma vez que os seus solos de massapê eram muito férteis e ideais para a plantação de vários tipos de cultivares. Mas, o Governador Pedro de Almeida ficou no cargo somente até abril de 1678, sendo substituído no cargo pelo astuto Aires de Souza e Castro.

Para firmar este acordo, Ganga Zumba foi recebido no Recife, em novembro de 1678, com as honras de um chefe de estado! Dentro do palácio do Governador Aires de Souza e Castro, ele aceitou o tratado de paz, e decidiu se mudar para o Vale do Cucaú, para onde se dirigiu com seus familiares e aqueles negros que também decidiram aceitar a paz. 
Mas seu sobrinho, Zumbi dos Palmares, não concordou com o acordo, pois queria que os negros que não tivessem nascido no Quilombo dos Palmares, e que lá moravam, também fossem livres! Assim, Zumbi decidiu prosseguir na luta, e enviou uma tropa de correligionários para conversar com seu tio, o agora Mestre de Campo Ganga Zumba, no Vale do Cucaú.

Na verdade, este acordo com o Governador não passava de um golpe para dividir as forças palmarianas e tentar desestabilizar o quilombo. Mais tarde, todos aqueles que foram morar no Vale do Cucaú foram reescravizados e distribuídos entre os senhores de engenho da região!

No mesmo ano de 1678 os correligionários de Zumbi conseguem envenenar Ganga Zumba, que morreu naquela região, desiludido e longe dos Palmares. Ganga Zumba ainda deixou seu irmão Gana Zona como rei do Quilombo dos Palmares, mas ele só governou por pouco mais de um ano, sendo substituído por Zumbi.

Quem quiser saber mais informações sobre a Guerra dos Palmares pode acessar o site abaixo:




Zumbi estava certo em não querer fazer acordo com os traiçoeiros representantes da Coroa Portuguesa! Mas, errou em permanecer na Serra da Barriga, em Alagoas, subestimando assim o poder bélico da colônia portuguesa.

Com apenas 25 anos de idade, Zumbi dos Palmares foi aclamado, em 1680, como o quarto rei do Reino dos Palmares, onde reinou por 14 anos, até o ano de 1694. Pelo estado de guerra em que viviam os palmarianos, durante o período em que Zumbi foi rei, foi implantada uma espécie de ditadura dentro do quilombo, sendo permitindo inclusive que os nobres palmarianos também tivessem os seus escravos. Ninguém podia sair das terras do quilombo sem a sua autorização.

Zumbi dos Palmares utilizou-se das técnicas de guerrilha para atacar as fazendas e engenhos da região açucareira de Pernambuco, com a intenção de se apoderar de armas, suprimentos e munição. Ele não aceitava se render!

Quem quiser saber mais coisas sobre Zumbi e Palmares, basta assistir ao vídeo apresentado abaixo que conta um pouco desta interessante história:




Quando tinha apenas 6 anos de idade, Zumbi foi capturado pela expedição de Brás da Rocha Cardoso, dentro da região do Quilombo dos Palmares, e levado para a paróquia de Porto Calvo, onde foi entregue aos cuidados do Padre Antônio Melo, que cuidou da sua educação.

Zumbi foi batizado com o nome de Francisco, aprendeu a falar português e também o latim. Ajudava o padre na igreja, mas quando completou 15 anos, resolveu fugir e voltou para o Quilombo dos Palmares.

Zumbi aprendeu a lutar e, quando tinha cerca de 20 anos de idade, ajudou a combater a expedição do Sargento Manuel Lopes, em 1675, onde levou um tiro na perna e ficou manco para sempre! Durante esta batalha, Zumbi mostrou muita coragem, já despontando como uma das grandes lideranças do quilombo. A Zumbi é atribuída a famosa frase: “Aquele que não quer ser escravo, não deve ter medo de morrer!”

Mais tarde Zumbi casou-se com Dandara, uma guerreira negra do quilombo com a qual teve três filhos. Zumbi nasceu em 1655 e muito provavelmente não era realmente neto de Aqualtune. Mas também aprendeu a falar o idioma kimbundu e foi criado junto com os filhos da nobreza do Reino dos Palmares. Durante a sua infância, Zumbi foi amigo de Andalaquituche, filho de Sabina, e neto da rainha Aqualtune.

Durante o reinado de Zumbi o quilombo sofreu vários tipos de ataques, mas em 1693 o Governador da Capitania de Pernambuco resolveu acabar de vez com o quilombo e contratou o bandeirante paulista Domingos Jorge Velho para organizar uma grande expedição contra o quilombo. 
Jorge Velho era um mestiço caboclo que tinha a aparência de um selvagem, andava descalço e não sabia falar português, apenas tupi. Mas, estava acostumado a organizar grandes expedições para combater os índios e os negros quilombolas.

Entre 1680 e 1684 ele organizou na sua fazenda, situada na região do Rio Piancó, na Paraíba, um pequeno exército, com cerca de 1.300 índios e cerca de 820 brancos, para enfrentar o Quilombo dos Palmares. Em março de 1687 ele assinou um contrato com o Governador de Pernambuco, que naquela época era João da Cunha Souto Maior, estipulando os seus direitos e obrigações.

Jorge Velho contou com a ajuda dos contingentes de soldados sob o comando do Capitão-Mor Bernardo Vieira de Melo, outro bandeirante que já havia lutado contra Ganga Zumba, na época da expedição do sertanista Fernão Carrilho. Mais tarde Vieira de Melo também participou da famosa Guerra dos Mascates, em Recife, onde foi preso.

O total das forças que atacaram o Mocambo dos Macacos, na Serra da Barriga, foi estimado em cerca de 8.000 homens, com escopetas e também canhões! Esta foi a maior expedição militar do período colonial, uma vez que implicou na mobilização de tropas militares de Pernambuco, Paraíba, Rio Grande do Norte, Bahia e até do Maranhão!

As tropas de Jorge Velho e Bernardo Vieira cercaram o mocambo e construíram uma paliçada com cerca de 600 metros, bem em frente da paliçada dupla do Mocambo dos Macacos, de onde podiam facilmente manobrar os canhões para disparar.

No dia 06 de fevereiro de 1694, depois de um cerco de três anos ao mocambo, e uma grande batalha final de 22 dias, o Mocambo dos Macacos, a grande capital do Reino dos Palmares, foi finalmente destroçado! A esposa de Zumbi, Dandara dos Palmares, preferiu suicidar-se a ser capturada, e atirou-se de uma montanha, quando foi cercada pelas tropas inimigas.

Zumbi foi ferido, mas mesmo ferido, ainda conseguiu fugir para a Serra dos Dois Irmãos, onde juntou um grupo de quilombolas sobreviventes do ataque, e resistiu por mais de um ano!

Entre os negros capturados em Palmares estava o quilombola Antônio Soares, que foi torturado e, mediante a promessa de que seria solto, revelou onde estava escondido Zumbi.

Começou a circular entre os escravos da capitania a história de que Zumbi era invencível, pois era um espírito e não podia ser morto! O Governador da Capitania, que naquela época já era Caetano de Melo e Castro, temendo um endeusamento da figura de Zumbi entre os escravos, resolveu enviar para a Serra Dois Irmãos, no atual Município de Viçosa, outra expedição encarregada de capturar Zumbi, sob o comando do Capitão Furtado de Mendonça.

Seguindo as informações, conseguidas com a tortura dos prisioneiros, Furtado de Mendonça localizou Zumbi no seu esconderijo, na companhia de 20 outros quilombolas guerrilheiros.

Zumbi foi morto, em 20 de novembro de 1695, quando estava com 40 anos de idade, e o seu corpo foi enviado para Porto Calvo. Em Porto Calvo Zumbi teve sua cabeça cortada, salgada e enviada para o Governador, em Recife. Sua cabeça ficou sendo exibida no pátio de uma igreja, no alto de um poste, para servir de exemplo para outros escravos que queriam fugir, até a sua completa decomposição. Muitos escravos ainda ficaram falando que Zumbi não tinha morrido e que aquela não era a sua cabeça!

O rei de Portugal, Dom Pedro II, resolveu premiar o Capitão Furtado de Mendonça com 50 mil réis, por ter conseguido matar Zumbi, rei do Reino Negro dos Palmares!

Na verdade, a resistência dos quilombolas, dentro do território do Reino dos Palmares ainda não tinha terminado! O Quilombo dos Palmares ainda resistiu a várias outras expedições, por mais de 20 anos, até aproximadamente 1716, quando o seu último mocambo foi destruído e ele finalmente se dissolveu. Palmares foi destruído também em virtude das mudanças ocorridas naquela região, principalmente em virtude do avanço das lavouras, da pecuária e da descoberta do ouro nas Minas Gerais.

Em 1700 foi descoberto os primeiros veios de ouro na região das Minas Gerais e houve uma grande debandada geral para aquela região central do Estado do Brasil. Todas as atenções dos comerciantes, fazendeiros e dirigentes coloniais estavam agora direcionadas para aquela região do sudeste da colônia. Por isso, o Quilombo dos Palmares foi um pouco esquecido.

Hoje o Brasil é o segundo país do mundo em número de negros, só perdendo para a Nigéria. Pelo Censo de 2010, 97 milhões de brasileiros se declararam negros e 91 milhões se declararam brancos. Assim, mais da metade da população atual do Brasil é negra e descendente dos povos africanos!

Em toda a história da humanidade as elites dominantes sempre procuraram preservar os seus privilégios, valendo-se para isto de estratagemas e forças repressivas brutais, contra as legítimas lideranças emanadas do meio das classes exploradas.

O sonho de liberdade dos escravos negros continuou vivo por mais de um século, vindo a concretizar-se somente em maio de 1888, com a abolição da escravatura no Brasil. No Brasil, o Dia Nacional da Consciência Negra é celebrado em 20 de novembro, justamente no dia em que morreu Zumbi dos Palmares, o último rei do utópico Reino dos Palmares!